ALFABETIZAÇÃO IMPROVISADA
O início da alfabetização e os primeiros anos escolares constituem,
para os educandos, uma deslumbrante e encantadora fase da vida, em que as descobertas despertam sonhos e esperanças.
A minha foi um tanto conturbada pela quebra de continuidade, com as constantes mudanças de escolas e de professores. Contudo não deixou de ser uma fase bem feliz, da qual guardo recordações muito gratas.
Iniciei a alfabetização aos seis anos com a minha paciente e doce mãezinha Isabel e, aos sete, na “Escola Mista da Estação de Caiuby”, com a inesquecível professora Da. Madalena.
Assim, sucessivamente, passei pelo 2º ano do ensino primário, com a Profa. Da. Alcídia, no “Grupo Escolar” de São Bento, onde também morei; o 3º ano em Remanso, na escolinha da Profa. Da. Yolanda, e o 4º ano em Cordeirópolis, no “Grupo Escolar Cel. José Levy”, com a Profa. Da. Aita.
Estávamos no ano de 1944 quando realizei a minha primeira experiência pedagógica improvisando um trabalho voluntário de alfabetização.
Com a idade de treze para quatorze anos eu estava frequentando a 2ª série ginasial do “Ginásio Estadual de Araras” para onde viajava diariamente de trem.
O “Bastiãozinho”, como o chamávamos, era um garoto da minha idade que morava no Sítio Viganó, e nunca frequentara uma escola; era analfabeto e, por viver isolado de outras crianças, mal sabia conversar sendo muito tímido e desconfiado.
Todas as tardes ele aparecia lá na ponta da plataforma, descalço, vestindo uma camisa surrada, calça até o meio da canela e um chapeuzinho de palha como era a moda nos meios rurais.
Muito acanhado e medroso ele não se aproximava do escritório da estação e esperava que lhe levassem o jornal que vinha pelo trem em nome de seu patrão.
Com jeito e perseverança procuramos dele nos aproximar e nos tornamos bons amigos.
Percebi que desconhecia muitas coisas das nossas serventias comuns como: sabonete e creme dental ...
Logo que comecei ler para ele alguns trechos do jornal demonstrou interesse por aprender a leitura e já identificara algumas letras e palavras. A motivação fora essencial para a aprendizagem.
Da. Iolanda cedeu-nos a sala de aula; o Sr. Viganó concordou em que ele permanecesse mais tempo fora do Sítio.
Tomo a “Cartilha da Infância” de Thomaz Galhardo, 138ª edição de 1938, a mesma pela qual fui alfabetizado e conservo até hoje e, com todo meu despreparo, mas com muita vontade, usando a pura e insólita silabação, fui insistindo com perseverança na busca do nosso objetivo.
Os primeiros resultados começaram a surgir e nos entusiasmamos. No final do ano o discípulo esforçado conseguira ler e compreender
palavras, frases e textos.
Dava gosto ver o “Bastiãozinho”, já desembaraçado e mostrando-se
bem contente, ler para as crianças e adultos até trechos do jornal.
A felicidade consiste em fazer os outros felizes!
Não é tão difícil improvisar um trabalho de alfabetização.
Luiz Gonzaga S. Ferreira - Araraquara, 18/04/09
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